Parte 2: Negociação em Situações Críticas e com a Presença de Reféns

Estamos de volta para a segunda parte da nossa exploração sobre negociação em situações difíceis com reféns. Se você já deu uma olhada na Parte 1, ótimo! Agora, vamos aprofundar um pouco mais.

Na primeira parte, falamos sobre como essas negociações evoluíram ao longo do tempo e os diferentes tipos de negociação. Na Parte 2, vamos dar um passo adiante.

Prepare-se para descobrir mais sobre os objetivos específicos dessas negociações, o que a experiência prática nos ensinou e como avaliar o andamento do processo. Em vez de apenas teorias, queremos compartilhar insights práticos que podem realmente fazer a diferença.

OBJETIVOS DESSES TIPOS DE NEGOCIAÇÃO

Monteiro (1997) nos ensina que em uma negociação em situações críticas temos quatro grandes objetivos a atingir:

a) Ganhar tempo: é um dos objetivos mais importantes em situações críticas. O tempo ganho reverte diretamente para baixar o nível de tensão / estresse, assim como também em um precioso ativo que permite a preparação e o planejamento da Força Tática que eventualmente poderá vir a ser empregada.

Há que se considerar, ainda, que o fato de o negociador ser a única ponte entre os criminosos induz (ainda que indiretamente) a percepção de que eventuais demandas levarão certo tempo para serem atendidas, posto que o agente da lei não possui poder para tomar determinadas decisões – elas deverão ser encaminhadas para o comandante da cena de ação, a quem caberá aprová-las (ou não). Na prática, tal fato também colabora para que se ganhe tempo nas negociações.

b) Abrandar as exigências: também importante, esse objetivo tem como propósito evitar que a agente perturbador da ordem pública empregue táticas como a das demandas crescentes, onde o atendimento de um pedido tem como resposta um novo pedido, não raro maior e sem qualquer conexão com o anterior. Uma boa analogia são jovens que foram acostumados a terem tudo o que pedem e nunca ficam satisfeitos com o que conseguem – seja dinheiro, celular, passeios, etc. No momento em que forem contrariados, eles tenderão a agir de forma emocional, gerando assim estresse e tensão para seus responsáveis.

Além disso, busca-se ainda quebrar a expectativa de que tais demandas sejam atendidas de forma rápida, evitando a criação de uma situação em que o não atendimento posterior gere estresse e tensão.

c) Coletar informações: outro importante objetivo, a partir do qual é possível não apenas aumentar a consciência situacional do negociador, mas também estimar quais devem ser os passos seguintes do negociador. Adicionalmente, as informações coletadas serão valiosas em caso de necessidade de evoluir para uma negociação tática. Elas podem ser obtidas a partir da análise do perfil do agente perturbador da ordem, do seu estado mental, dos dados por ele transmitidos, de pesquisas em relação à sua vida pregressa, entrevistas com reféns libertos e eventuais membros que decidiram se entregar, dentre outras possibilidades.

d) Prover suporte tático: dentre todos, é aquele que está mais voltado a buscar criar condições para o emprego exitoso da Força Tática. Nele, as ações desenvolvidas pelo negociador vão desde a coleta de dados até, no limite, a efetiva participação ativa da entrada forçada no local onde os agentes perturbadores da ordem se encontram. Por envolver um conjunto de ações específicas de cunho julgado sensível, optou-se por não as detalhar neste artigo.

O QUE A PRÁTICA TEM NOS ENSINADO?

Dentre os muito ensinamentos colhidos pela prática, há alguns aspectos que devem sempre ser levados em conta no desenvolvimento do processo:

a) Não é para qualquer um: se por um lado parece óbvio que estar apto a dar as melhores respostas sob tensão depende de ótima capacitação técnica, de outro (e menos evidente) há também a necessidade de desenvolvimento de um conjunto de habilidades comportamentais (as chamadas soft skills) naqueles que estarão na linha frente desse combate. Muito mais do que em outras tipologias negociais, a formação de um negociador para trabalhar em situações críticas requer um atento delineamento ao perfil comportamental do candidato..

Há várias ferramentas no mercado que podem ser empregadas para identificar perfis comportamentais. No Clube de Negociadores utilizamos o Style Matters, que possui validação científica e classifica a propensão dos indivíduos em adotar 5 perfis básicos para lidar com conflitos: competitivo; evasivo; prestativo; colaborativo; e conciliador.

A partir desse delineamento inicial, desenvolvemos nos nossos mentorados a capacidade de “navegar” por todos esses perfis, de forma consciente, adotando aquele

que se mostrar mais adequado à situação vigente e ao perfil da contraparte com que negocia. O foco? Obter os melhores resultados possíveis em cada situação.

b) O trabalho do negociador: embora sua atuação tenha uma grande centralidade no processo negocial, é sempre importante destacar que o negociador não deve trabalhar sozinho. A presença de outros elementos na sua área de trabalho – analistas, psicólogos, auxiliares, etc – é fundamental para que os dados obtidos (ou levantados como necessários) sejam devidamente processados e apontem os melhores caminhos a seguir.

c) Contato com agentes causadores: ainda que se possa colocar um elemento em contato inicial com o agente causadores até a chegada da equipe ao local, após assumir sua função o negociador deve ser o único ponto de contato com os elementos perturbadores da ordem. Isso permite um melhor controle do fluxo de informações e permite o estabelecimento de relações de confiança e produtivas entre ambos.

d) Poder de decisão: é fundamental relembrar que o negociador, por definição, não possui poder decisório, sendo ele apenas o canal por onde as informações fluem “de” e “para” os agentes perturbadores. Isso possibilita que se ganhe tempo no processo negocial, bem como evita que decisões sejam tomadas “no calor da batalha’ e / ou sem considerar todo o contexto existente.

e) Não incorporar riscos adicionais: como regra, considera-se que quaisquer solicitações que elevem o risco da operação não devem ser aceitas. Todas as concessões devem ter como pano de fundo um efeito desejado associado, preferencialmente a obtenção de vantagens táticas que possibilitem ações futuras.

f) Troca de reféns: durante a negociação real em hipótese alguma deve ser realizada, uma vez que eticamente não há hierarquia para o valor e vidas humanas e os riscos associados à presença de um novo membro no cativeiro são altos demais, podendo inclusive causar desestabilização / agravamento da situação.

Durante a negociação tática, em situações muito específicas onde a troca venha a fazer parte do contexto que precede a ação em força, pode-se vir a discutir essa possibilidade.

COMO AVALIAR O ANDAMENTO DO PROCESSO NEGOCIAL?

Uma vez adotadas as medidas necessárias para mitigar e resolver a situação, surge a pergunta: como poderíamos avaliar o andamento da situação? Uma das formas é empregar os 5 parâmetros a seguir:

a) Ninguém foi morto desde que as negociações iniciaram: deve-se atentar para o detalhe de que pode ter havido um confronto inicial antes da estabilização da crise e, nesse fato, haver mortes. Para análise deste parâmetro, a contagem deve ser iniciada somente após o início das negociações;

b) Redução dos incidentes emocionais: o número de incidentes emocionais (incluindo ameaças verbais e agressões físicas e psicológicas aos reféns) está diminuindo;

c) Aumento do tempo das conversas: a duração de cada conversa tem aumentado, a velocidade do falar está mais lenta e há menos referência à violência nos diálogos;

d) Redução dos elementos sob risco: houve liberação de reféns;

e) Prazos fatais (ameaças de matar reféns até um horário determinado): em menor número e superados sem incidentes.

CONCLUSÃO

Diferentemente das ciências exatas, processos negociais de qualquer natureza incorporam variáveis de complexa interação e mensuração, uma vez que envolvem além de situações distintas, seres humanos com suas particularidades e propensão a reações diversas. Situações de crise como um evento envolvendo reféns potencializam esses efeitos, com o agravante do estado de tensão que permeia todas as partes. Nesse sentido, a mera capacitação técnica não se mostra suficiente para lidar com as situações de forma efetiva – é preciso também trabalhar com profundidade as habilidades comportamentais (soft skills).

A identificação prévia do perfil comportamental dos candidatos a trabalhar nessa área é de suma importância. O emprego da ferramenta Style Matters, representada de forma exclusiva no Brasil pelo Clube de Negociadores, mostra-se um caminho interessante que envolve um investimento de baixíssimo custo em função de sua objetividade.

Por mais paradoxal que possa parecer, é importante que o negociador busque criar um ambiente colaborativo (ou, ao menos, conciliador) com suas contrapartes para alcançar uma solução mutuamente aceitável; para isso, invariavelmente as partes necessitarão fazer concessões.

Mais do que nunca, o processo negocial deve ser compreendido como um jogo de xadrez, no qual a escolha e sequência de movimento das peças (tática) deve obedecer ao quadro mais amplo (estratégia), que tem com bem maior a salvaguarda de vidas humanas. Entender as necessidades alheias e os movimentos de sua contraparte são fundamentais para garantir uma resolução pacífica.

REFERÊNCIAS

COSTA, Cristiano Rocha Affonso da. Negociação de crises e reféns: o trabalho do negociador no gerenciamento de eventos críticos. Curitiba: Editora Matilda Produções. 1a ed. 2016.

MONTEIRO, Roberto das Chagas. Doutrina de Gerenciamento de Crises. Brasília: Acadepol DPF. 3a ed. 1997.

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